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Dia de aboios e saudade! - Pe. Leonardo Sales

O dia 31 de dezembro encerra o ano e assinala a cada um de nós, batalhenses, desde tempos antigos a procissão dos vaqueiros em Batalha, para além da curiosidade pessoal, sempre alimentada, pois desde menino ia ao patamar da matriz para ver com muita atenção e grande emoção a bênção dos vaqueiros, mas sempre insatisfeito, em relação a pouca atenção que os vaqueiros recebiam, seja pela organização sempre precária à altura do que o evento simboliza e significa, quer seja pela insensibilidade de muitos ao que se passava.
Este dia sinaliza o fim de um ciclo e início de outro, o vaqueiro une ao seu aboio as suas angústias e suas esperanças, proclama ao seu modo, qual Evangelho, as notícias de sua vida sofrida e suas teimosias, este dia simboliza o grito de sobrevivência e a oração de agradecimento pelo inverno que passou e na garganta o pedido a Deus que das nuvens chovam águas para não morrer o gado de sede e o pasto não faltar!
Na complexidade que é o amor e o amar a vida no sertão, há lugar para pessoas, filhos, amantes, parceiros, amigos, grupos, ideais, projetos, trabalhos, vocações, lugares, etc., nenhum se substitui e desejadamente todos se completam e conjugam objetos investidos do que cada um precisa sentir e viver. A pessonalidade do vaqueiro transborda para fora de seu gibão e realiza fora de cada um, como denominador comum a todas as formas de perseverança.
Complexa e simples é a vida do vaqueiro. Complexa, difícil, labiríntica… ocorrem-me histórias. E estas me transportam para os tempos em que nas grandes fazendas sua existência era obrigatória, era tempo que a riqueza se media pelo número de cabeças de gado que possuía um senhor de engenho, ou mesmo um capitão, daqueles que tinham em torno de si uma família numerosa e sei lá quantos empregados, tudo custeado pelo leite ou pela carne bovina. Aqueles tempos quase passaram em Batalha, restam poucos sinais, a vida hoje se centraliza na cidade.
Chapéu de couro na cabeça, manto sobre os ombros, em cavalos exibidos e ou sobre o lombo das éguas faceiras, eis o vaqueiro na montaria, eles são homens reais que, apesar de muitas quedas, tendem à sublimação: da seca, e do calor, da carência, nas suas vidas alternam fraquezas e virtudes, traições e arrependimentos, limitações e santidade, sempre imersos no fluxo da resistência, justificando o que disse Euclides da Cunha nos “Sertões” o sertanejo “é antes de tudo um forte”.
Recordo-me quando menino acordar cedo para ver a boiada passar, do Mimoso para a Puba, ou o movimento contrário, no período da transumância, quando o gado era transportado de uma região para outra, para os olhos era um encantamento, e comigo pensava “este vaqueiro é muito rico”, mas depois era avisado que o gado não era dele, mas de um fazendeiro a quem obedecia  ordens e a  quem dependia a sobrevivência. No meu encanto de menino pensava … um dia ainda vou ter muitos bois e não vou ter vaqueiros, não sei se era um misto de egoísmo com mania de riqueza, ou uma pequena sombra de justiça que sempre habitou minha alma!
Os aboios eram uma espécie de canto repetitivo, um lamento que pastoreava o gado, mesmo o boi mais valente com a “careta” seguia os comandos da voz do vaqueiro, eu quase não entendia nada, era um canto místico, beirando a tristeza e a valentia do vaqueiro, e que servia para guiar o rebanho. Montados em cavalos artesanais feitos com o pau da palha de carnaúba, os meninos da rua imitavam um vaqueiro, com aboios e malandragens, porém, não sabia a afoita molecada que a vida de vaqueiro não é brincadeira!
Neste dia 31 de dezembro, dia da procissão dos vaqueiros os homens do campo vêm em procissão pedir a bênção de São Gonçalo, para suas vidas, seus campos e rebanhos, este santo é um vizinho deles, mas que padroeiro, está lá em cima do morro, como diz uma antiga lenda que esta imagem de São Gonçalo foi encontrada por um vaqueiro, se é verdade ou lenda, já não sei.
O que sei é que hoje é um dia de saudades! Estação… Saudade! Aqui, quis fazer uma viagem sobre os trilhos das recordações. A trilha sonora que embalou momentos inesquecíveis das nossas vidas. Acomodados num dos vagões da nossa memória movida à saudade e conduzida por este maquinista saudosista, que se propôs a dividir com todos vocês seu acervo de memórias. Viva o vaqueiro! Valeu o boi!
Pe. Leonardo de Sales.

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